[Resenha] Ensaio Sobre a Cegueira


ENSAIO SOBRE A CEGUEIRA

José Saramago | Companhia das Letras | 432 páginas | 2022
Lido em parceria com a Editora pela plataforma NetGalley


Ensaio Sobre a Cegueira, de José Saramago mais que uma obra magnífica, é um convite à reflexão! 

A história inicia-se em um dia normal, onde um homem à caminho do trabalho, espera o sinal ficar verde. Sem qualquer aviso, é acometido por uma cegueira, uma nuvem branca cobre toda sua visão. O Primeiro Cego.

Confuso e apavorado, o Primeiro Cego vai à procura de um  oftalmologista que encontrasse o motivo de sua cegueira. O fato é que é algo muito estranho, já que os olhos estão em perfeito estado. Diante disso, o Doutor tenta investigar as possíveis causas e é acometido pela mesma cegueira.

"Penso que não cegamos, penso que estamos cegos, Cegos que vêem, Cegos que, vendo, não vêem."

É ai que começa toda tensão e profundidade do livro, pois a cegueira coletiva começa a se alastrar e a ficar sem controle. O pânico toma conta de todos e para não ganhar maiores proporções e a sociedade entrar em colapso, o Governo decide colocar os cegos em quarentena. Todos são enviados para um manicômio abandonado e isolado.

No entanto há uma única pessoa que não foi acometida pelo mal, a Mulher do Doutor, que para acompanhar o marido, não revela que enxerga perfeitamente e assim segue para a quarentena, sem saber o inferno que os espera.

Ensaio Sobre a Cegueira é um livro forte que retrata o homem em sua pior essência. Quando ninguém pode ver o que você faz, quando existe a penúria, os instintos se afloram, não há regras, moral ou ética, é a degradação do ser humano.

"Cegueira também é isto, viver num mundo onde se tenha acabado a esperança".

Saramago usa uma escrita direta e pode chocar, não há sentimentalismo algum, a abordagem dos fatos é nua e crua, e é inevitável para o leitor sair da leitura sem ser tocado, sem pensar como reagiria em uma situação limite.


É cruel ver os cegos se digladiando por comida, o bom senso deixa de existir, é a lei do mais forte. E não foi só isso, muitas coisas ocorrem e tem partes bastante avassaladoras, que eu precisei de um tempo para prosseguir. 

"De uma certa maneira, tudo quanto comemos é roubado à boca de outros, e se lhes roubamos de mais acabamos por causar-lhes a morte, no fundo todos somos mais ou menos assassinos."

Saramago nos passa de forma clara e crítica uma sociedade egoísta e hipócrita, nos mostrando a miséria humana e sua crueldade. O escritor faz uma verdadeira dissecação da alma humana.

Outro ponto que quero dar destaque é como os personagens são descritos, eles não possuem nomes, são apresentados por determinada característica física, comportamental ou profissional. Achei que esse detalhe deu um valor maior ainda para a obra, pois deixa claro a igualdade e nada mais. Eles eram "mais um cego" entre milhões.


A obra nos leva a reflexão, sobre o que somos, sobre a sociedade em que vivemos e sobre o mundo que criamos. O homem se mostra incapaz de lidar com situações conflitantes.

"Se não formos capazes de viver inteiramente como pessoas, ao menos façamos tudo para não viver inteiramente como animais, tantas vezes o repetiu, em sentença, em doutrina, em regra de vida, aquelas palavras, no fundo simples e elementares."

Entretanto, diante desse quadro angustiante dos cegos, temos a figura da Mulher do Doutor, que tenta ajudar e orientar. Mesmo passando por várias situações constrangedoras, é determinada e uma personagem inspiradora. Há uma esperança?

Ensaio Sobre a Cegueira não é uma leitura fácil, não somente pelo tema, mas também pelas pontuações livres, pela falta de separação entre uma fala e outra e pela linguagem, por isso é preciso não ter pressa para melhor compreensão da obra. 

É uma história que nos faz sofrer diante de um mundo decadente onde parece não haver saída, a não ser a adaptação. Um livro que traz muitos questionamentos e reflexões.

Uma leitura muito válida!!


 

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