[Resenha] Prazer em Queimar

PRAZER EM QUEIMAR - Histórias de Fahrenheit 451

Ray Bradbury
Biblioteca Azul | 2020 | 416 páginas
Recebido em parceria Globo Livros



Ray Bradbury ficou mundialmente conhecido pelo célebre livro “Fahrenheit 451”, uma distopia, ou “antevisão” sobre o destino de nossa sociedade, aparentemente inteligente, mas facilmente conduzida aos rumos dos vícios e prazeres. 

“Prazer em Queimar” é a reunião de dezesseis contos, que Ray escreveu, com alguma ou muita relação com a mensagem de “Fahrenheit 451”, incluindo “O Bombeiro”, que posteriormente foi ampliado, renomeado e publicado, vindo a ser sua principal obra. 

“Somos uma minoria, os recém-mortos, os recém-embalsamados, os recém-enterrados, somos uma minoria no mundo, uma minoria perseguida. Existem leis contra nós. Não temos direitos!” 

O trecho anterior é do conto “O Reencarnado”, onde o autor parece protestar, através do personagem, sobre anular a memória, o passado, limitando nossa avaliação do presente. Ele segue descrevendo as consequências dessa prática no trecho a seguir:

 “De toda a estupidez, toda a estupidez rastejante, nojenta, podre, asquerosa, ele nunca vira algo assim na vida! Crianças crescendo sem um pingo de imaginação! Qual era a graça de ser criança se você na imaginava coisas?” 

Em a “Fênix Brilhante”, inicia-se o processo de queima de livros. Uma biblioteca é invadida por uma divisão do governo incumbida de destruir em torno de 50 por cento dos acervos de livros. E numa conversa com o bibliotecário o encarregado da missão lhe confidencia que os livros são mais perigosos que os exércitos. O ano é 2022, assustador! Não? 

“As pessoas tem sempre algum campeão a quem puseram sobre elas a quem nutrem de grandeza... Isso, e nenhuma outra coisa, é a raiz da qual um tirano surge; quando ele aparece pela primeira vez, é um protetor.” (o autor cita Platão) 

Neste mesmo conto Ray Bradbury delineia personagens que fazem referências constantes aos mais diversos autores e notáveis referências, desconhecidos das marionetes incendiárias. Isso parece ser o início do processo de alienação intelectual da população, e não existe ninguém melhor que um grande ignorante e imbecil para fazer o “trabalho” de destruição do conhecimento científico e sociológico. 

Em “Muito Depois da Meia-Noite”, Montag, protagonista de “Fahrenheit 451”, num certo momento descobre o abismo que há entre sua esposa e ele. Nada sabem um do outro; gostos, aspirações, medos, nada além de uma convivência vazia e automatizada, sem aprimoramento da alma, aliás, que alma poderia existir numa população padronizada? Em seres que sentem prazer com as mesmas coisas, que riem e assistem aos mesmos programas banais e superficiais? Nada vai além do raso e simples, pois não é mais necessário raciocinar. Não é mais permitido questionar ou contestar; agora, só iremos degustar o prato que é posto a mesa, um prato que nem escolhemos. 



Prazer em Queimar”, deve ser lido por diversas vezes, já que o autor nos alerta sobre várias condutas que nos leva a abrir mão do valioso bem que é a liberdade. Há um comportamento de massa que pouco questiona os controles do Estado sobre o indivíduo. Como quando concordamos com os termos de uso de um aplicativo sem lê-los, pois não há tempo a perder para sentir prazer, deixar a onda te levar.

O autor completaria seu centenário esse ano e para comemorar a data, a Biblioteca Azul planeja, até 2021, reeditar alguns títulos e também publicar textos inéditos. "Prazer em Queimar" é o primeiro deles.


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